
NWA 11809
Fatia 0.294g
- País: NW. Africa
- Ano achado: 2017
- Classificação: Acondrito Lunar
- Massa total: 0,067 kg
- Queda observada: Não
NWA 11809
No sopé das dunas do Saara, entre os mercados de pedras de Erfoud, no Marrocos, onde meteoritos de todo o cosmos transitam entre mãos humanas, surgiu uma rocha diferente. Em setembro de 2017, o colecionador Fabien Kuntz adquiriu uma amostra peculiar de um comerciante local — uma pedra pequena, porém marcada por características únicas. Mal sabia ele que carregava em mãos um fragmento da Lua, uma peça arrancada da crosta de nosso satélite natural, lançada ao espaço por um impacto antigo e violento, até finalmente ser recolhida por olhos atentos no deserto africano.
O meteorito, posteriormente analisado por Anthony Irving e S. Kuehner na Universidade de Washington, revelou uma brecha feldspática lunar, um tipo raro de rocha extraterrestre formada por múltiplos fragmentos litológicos unidos sob o calor e a pressão de colisões lunares. Em sua estrutura, são visíveis clastos minerais angulares — restos sólidos e cristalizados de anortita, olivina, ortopiroxênio, pigeonita, augita subcálcica e cromita rica em titânio, todos encaixados em uma matriz mais fina que, surpreendentemente, também apresenta traços de barita, um mineral de presença incomum nesse tipo de amostra.
A composição química dos minerais reforça sua natureza lunar: olivina variando entre Fa30,0 a Fa41,3, com razões FeO/MnO típicas do regolito da Lua; ortopiroxênio e pigeonita com características compatíveis com o manto superior lunar, e anortita extremamente cálcica (An92–95), sinal de origem na crosta feldspática da Lua, particularmente das terras altas lunares — regiões antigas, expostas, que guardam a história mais profunda de nosso satélite.
As brechas como esta se formam a partir de impactos meteóricos sucessivos na superfície lunar, que trituram, fundem e recompõem fragmentos de rochas pré-existentes, criando composições únicas que funcionam como fósseis geológicos de catástrofes celestes. Em algum momento, um impacto colossal lançou este fragmento da Lua ao espaço, onde vagou por milhões de anos até ser atraído pela gravidade da Terra e cair, silenciosamente, no deserto do norte da África.
Este meteorito lunar, hoje classificado formalmente como brecha feldspática lunar, é um pedaço direto da superfície da Lua, sem necessidade de missões espaciais para chegar às mãos humanas. Com apenas 14,11 gramas depositados na Universidade de Washington e a massa principal sob a guarda de Kuntz, ele é uma joia científica e histórica rara — um elo tangível entre a Terra e o único corpo celeste cujo rosto vemos todas as noites.
Ter um fragmento como este é segurar um pedaço da Lua em estado bruto, não em poesia ou fotografia, mas em matéria. Uma pedra que viu a escuridão absoluta, sobreviveu ao impacto, ao vácuo, e atravessou mundos para repousar, por fim, nas mãos de alguém na Terra. Um testemunho do passado violento do Sistema Solar — e da beleza serena que hoje ilumina nossas noites.

Acondrito
Os acondritos são meteoritos rochosos que se distinguem por não apresentarem côndrulos, aquelas pequenas esferas milimétricas de silicato características dos condritos. A ausência de côndrulos indica que essas rochas passaram por processos geológicos mais complexos, como fusão parcial, diferenciação e cristalização de magma, o que as aproxima muito das rochas ígneas encontradas na Terra. Diferente dos sideritos, que representam o material denso e metálico do núcleo de corpos planetários, os acondritos são originários das regiões externas — como o manto e a crosta — de planetesimais e asteroides que, nos primórdios do Sistema Solar, foram suficientemente grandes para passar por processos de diferenciação. Quando esses corpos se formaram a partir da nebulosa solar, o calor gerado por impactos e decaimento de elementos radioativos derreteu seus interiores, permitindo a separação dos elementos mais pesados e leves. Os materiais metálicos migraram para o centro, enquanto os silicatos deram origem a lavas e rochas ígneas nas camadas mais externas. Os acondritos são, portanto, fragmentos dessas crostas e mantos, e fornecem uma visão única da atividade geológica em corpos extraterrestres primitivos.
Dentro da grande categoria dos acondritos, existem vários subgrupos distintos, cada um associado a diferentes corpos parentais e processos geológicos. Os acondritos primitivos, como as acapulcoitas e lodranitas, são uma transição entre condritos e rochas totalmente diferenciadas. Eles preservam características químicas do material original da nebulosa, mas passaram por aquecimento suficiente para fundir parcialmente e eliminar os côndrulos. Já as brachinitas são acondritos extremamente ricos em olivina e representam um tipo de manto primitivo. As ureilitas são outro tipo peculiar, com alto teor de carbono, grafite e até diamantes microscópicos, provavelmente formados por impacto. Entre os acondritos diferenciados mais estudados estão os do grupo HED: howarditas, eucritas e diogenitas. Eles têm origem no asteroide 4 Vesta e representam diferentes profundidades da crosta e do manto desse corpo. As eucritas são basaltos de superfície, as diogenitas vêm de camadas mais profundas e as howarditas são brechas formadas por colisões que misturaram os dois tipos. Outras classes importantes são os angritos, que têm uma mineralogia única e provavelmente se formaram em planetesimais distintos, e os aubritos, ricos em enstatita e com aparência muito clara, derivados de asteroides extremamente reduzidos.
Também fazem parte dos acondritos os meteoritos lunares e marcianos. Os meteoritos lunares são fragmentos arrancados da crosta da Lua por grandes impactos e que viajaram pelo espaço até atingir a Terra. São compostos por basalto, anortosito e outros tipos de rochas semelhantes às amostras trazidas pelas missões Apollo, e ajudam a ampliar nosso conhecimento sobre regiões não visitadas da Lua. Os meteoritos marcianos, por sua vez, são extremamente raros e valiosos. Eles compartilham com as análises feitas por sondas em Marte a mesma composição isotópica de gases aprisionados, especialmente o argônio, e nos fornecem informações preciosas sobre o vulcanismo, a presença de água e as condições atmosféricas do planeta vermelho em diferentes épocas. Essas amostras nos contam que Marte foi geologicamente ativo por bilhões de anos. Entre os marcianos há três grupos principais: as shergottitas, basaltos ricos em piroxeno; as nakhlitas, formadas por clinopiroxeno e com evidência de interação com água; e as chassignitas, compostas predominantemente por olivina.
Os acondritos, apesar de não representarem a maior parte dos meteoritos encontrados, são verdadeiros arquivos geológicos que documentam a história dos processos ígneos no Sistema Solar. Por sua semelhança com as rochas terrestres, eles também funcionam como pontes para compreendermos como nosso próprio planeta evoluiu desde seus primeiros estágios. Cada acondrito é uma peça-chave em um quebra-cabeça cósmico que revela como pequenos corpos primordiais deram origem a mundos inteiros — e como esses mundos foram moldados por calor, tempo e colisões. Para cientistas e colecionadores, são relíquias de um passado distante e silencioso, guardando em seus minerais as pistas da origem e evolução dos planetas.