Campo del Cielo

Fragmento 63.7g

  • País: Argentina
  • Ano achado: 1576
  • Classificação: Siderito IAB
  • Massa total: 50000 kg
  • Queda observada: Não

Cristal

Campo del Cielo

A história do Campo del Cielo começa há mais de 4.000 anos, quando um gigantesco meteoro metálico cruzou os céus da atual região norte da Argentina, em uma das quedas mais impressionantes já registradas na história da humanidade. Ao atingir a atmosfera terrestre, esse corpo celeste se fragmentou violentamente antes de impactar o solo com força colossal, espalhando milhares de pedaços metálicos por uma vasta área que hoje compreende uma das maiores concentrações de meteoritos do mundo. Os povos nativos da região, testemunhas desse evento extraordinário, trataram os fragmentos como objetos sagrados — alguns foram usados em rituais, outros como matéria-prima para ferramentas e armas. Assim nasceu a lenda do “Campo do Céu”, nome que permanece até hoje como um dos mais icônicos da meteoritologia mundial.

Mais do que uma curiosidade arqueológica ou científica, o Campo del Cielo representa uma autêntica janela para o interior dos corpos planetários primordiais. Classificado como um siderito do grupo químico I, esse meteorito é formado essencialmente por ferro e níquel metálico, com traços de cobalto (0,43%), fósforo (0,25%), e elementos raros como gálio (87 ppm), germânio (407 ppm) e irídio (3,6 ppm) — uma composição que indica que ele se originou no núcleo metálico de um planetesimal diferenciado, um pequeno corpo rochoso que começou a se formar nos primeiros milhões de anos após o nascimento do Sistema Solar, há cerca de 4,56 bilhões de anos.

Esses corpos primordiais, como asteroides massivos, passaram por processos de diferenciação interna: o calor gerado por radioatividade e impactos os aqueceu o suficiente para derreter seus interiores, fazendo com que os materiais mais densos, como ferro e níquel, afundassem até o centro, formando um núcleo metálico. É justamente desse tipo de núcleo que se originam os sideritos como o Campo del Cielo. Com o tempo, colisões cósmicas destruíram esses corpos, lançando fragmentos ao espaço — alguns dos quais, após uma longa jornada de milhões de anos, acabaram por encontrar a Terra.

Cada fragmento de Campo del Cielo é uma testemunha silenciosa dessa história cósmica. Internamente, muitos deles exibem o famoso padrão de Widmanstätten, uma estrutura cristalina única formada pelo resfriamento extremamente lento do metal no vácuo espacial — um processo que leva milhões de anos e só ocorre sob condições impossíveis de serem reproduzidas em laboratório. Essa estrutura, revelada quando a superfície é polida e atacada com ácido, é não apenas um traço visualmente impressionante, mas também uma assinatura natural da formação do núcleo de um mundo perdido.

Além do seu valor científico e histórico, o Campo del Cielo possui um forte apelo estético e simbólico. Suas superfícies externas podem apresentar marcas de regmagliptos, pequenas depressões formadas pela interação com a atmosfera, enquanto o interior brilha com tons metálicos prateados e estruturas geométricas que fascinam tanto iniciantes quanto especialistas. O maior fragmento já encontrado pesa cerca de 37 toneladas, um verdadeiro monumento natural que destaca a escala do evento que trouxe esse meteorito até nós.

Ter um fragmento do Campo del Cielo não é apenas possuir uma peça de ferro espacial — é carregar nas mãos um pedaço do núcleo de um mundo antigo, formado antes mesmo da Terra existir. É uma conexão direta com a arquitetura interna dos planetas, com os processos que moldaram o Sistema Solar e com o legado ancestral das civilizações que primeiro encontraram esses corpos celestes caídos. Seu valor ultrapassa o colecionismo: é uma ponte entre ciência, história e contemplação cósmica.

Seja para colecionadores, educadores, museus ou simplesmente apaixonados pelo universo, o meteorito Campo del Cielo representa a união perfeita entre beleza natural, profundidade científica e origem estelar. Adquirir um fragmento é mais do que enriquecer uma coleção — é transformar qualquer espaço em um santuário de astronomia, história natural e mistério.

Siderito

Assim como os acondritos, os sideritos são provenientes de corpos parentais cuja matéria primordial sofreu diferenciação. Este material, originário da nebulosa que formou o sistema solar e presente nos meteoritos condritos, sofreu a ação gravitacional ao longo de bilhões de anos dando origem a todos os corpos que conhecemos hoje no sistema solar como o sol, planetas, asteróides, etc. Os sideritos são meteoritos provenientes do núcleo desses corpos parentais onde o material mais pesado se concentrou como o Ferro e Níquel. Apesar de haver um grande número de meteoritos ferrosos já catalogados, a grande maioria não teve a sua queda observada. Somente uma pequena parcela das quedas observadas corresponde a meteoritos sideritos, a grande maioria é representada pelos condritos. Levando-se a conclusão que os meteoritos ferrosos são relativamente mais raros que os rochosos em nosso sistema solar.

Uma vez em ambiente terrestre, os meteoritos ferrosos sofrem menos desgaste que os condritos e, desta maneira, ainda podem ser encontrados após milhares de anos de sua queda. Os condritos, por sua vez, rapidamente sofrem a ação da atmosfera e rapidamente passam a ser confundidos com rochas terrestres e sua descoberta se torna cada vez mais difícil. Desta maneira, temos registros que achados de meteoritos ferrosos de milhares de anos e vários relacionados a grandes crateras como Canyon Diablo no Arizona com cerca de 1200 metros diâmetro e 50.000 anos. Encontramos inúmeros outros exemplos de grandes achados com várias toneladas como o Campo Del Cielo na Argentina ou Gibeon na Namíbia. Devido também a sua alta resistência, os meteoritos ferrosos estão entre os maiores já conhecido, pois são mais resistentes a reentrada na atmosfera terrestre. O maior foi é o Hoba West, localizado na Namíbia com 6 toneladas. O maior meteorito encontrado no Brasil é o Bendengó com 5.3 toneladas e se encontra hoje no Museu Nacional, RJ.
Outro fator que ajuda no trabalho de busca dos meteoritos ferrosos é sua alta atratividade a imãs e ótima resposta a detectores de metais. Detectores de metais são extensamente utilizados em trabalhos de busca de meteoritos e não apresentam uma boa resposta em meteoritos rochosos.
Os meteoritos ferrosos são constituídos basicamente de uma liga ferro-níquel e uma pequena quantidade de outros elementos como germânio, gálio, ósmio e irídio que, por serem elementos pesados, se concentraram na região do núcleo do corpo parental.
Há duas metodologias de classificação para os meteoritos ferrosos, a mais antiga e tradicional é através do estudo da estrutura e proporção do metal níquel na liga ferro-níquel. Para tanto, bastava realizar o polimento de uma porção do material, realizar o tratamento com ácido nítrico e verificar que tipo de estrutura ficaria evidente. Com base nessa estrutura o meteorito recebia a sua devida classificação como Hexaedrito, Octaedrito ou Ataxito. Mais recentemente outro método baseado no estudo químico ou quantitativo de elementos como irídio e gálio em igual proporção de níquel passou a ser empregado. Desta classificação surgiram as seguintes classificações num total de 14 grupos diferentes: IAB, IC, IIAB, IIC, IID, IIE, IIF, IIG, IIIAB, IIICD, IIIE, IIIF, IVA, IVB. Além desses grupos uma pequena parcela ainda não foi agrupada recebendo esta mesma denominação.
Uma interessante relação entre esses dois tipos de classificações também foi observada e relacionada na seguinte tabela:
Classe estrutural
Símbolo
Camacita [mm]
Níquel
[%]
Grupo químico relacionado
Hexaedritos
H
> 50
4.5 – 6.5
IIAB, IIG
 Octaedrito Muito Grosseiro
Ogg
3.3 – 50
6.5 – 7.2
IIAB, IIG
Octaedrito Grosseiro
Og
1.3 – 3.3
6.5 – 8.5
IAB, IC, IIE, IIIAB, IIIE
Octaedrito Médio
Om
0.5 – 1.3
7.4 – 10
IAB, IID, IIE, IIIAB, IIIF
Octaedrito Fino
Of
0.2 – 0.5
7.8 – 13
IID, IIICD, IIIF, IVA
Octaedrito Muito Fino
Off
< 0.2
7.8 – 13
IIC, IIICD
Octaedrito Plessítico
Opl
< 0.2
9.2 – 18
IIC, IIF
Ataxito
D
-
> 16
IIF, IVB

 

Antes de descrever cada tipo estrutura, vale alguns comentários em relação à principal liga ferro-níquel, constituinte deste tipo de meteorito. Os dois principais tipos desta liga encontrados em meteoritos ferrosos são a kamacita e tenita. A formação de uma determinada liga de ferro-níquel no núcleo do corpo parental vai depender da proporção de níquel presente na liga ferro-níquel, da temperatura e velocidade de resfriamento. Se a proporção de níquel na liga ferro-níquel for baixa, entre 4.5 e 6.5 %, a liga resultante será a kamacita. Se a proporção de níquel for alta como 30% ou mais em relação ao ferro, teremos somente a formação da tenita. Como a proporção de níquel num meteorito ferroso está situada entre 6 a 13%, encontramos as ligas formadas somente de kamacita, somente de tenita e uma mistura das duas ligas.
Octaedritos (O): Tipo mais comum de siderito exibindo a famosa figura de Widmanstätten quando polido e tratado com ácido nítrico. É composto por uma mistura de kamacita e tenita interligados. A interligação espacial entre a kamacita e tenita se dá na forma de um octaedro, dando o nome de octaedrito a esse grupo. O espaço entre as placas de kamacita e tenita são preenchidos por uma fina mistura granular de kamacita e tenita chamada Plessita (preenchimento em Grego). Os Octaedritos são novamente classificados de acordo com a espessura da camada de kamacita na figura de Widmanstätten.
Hexaedritos (H): Tipo formado essencialmente por kamacita. O nome hexaedrito se fere a rede cristalina onde esta liga é formada. A rede cristalina tem formato cúbico com seis lados iguais e com ângulos retos entre os mesmo formando um hexaedro. Os hexaedritos não exibem o padrão de Widmanstätten como a maioria dos outros sideritos e sim pequenas linhas finas denominadas “Linhas de Neumman”, em homenagem ao seu descobridor Franz Ernst Neumann e identificou essas linhas em 1848. Estas “Linhas de Neumman” são indicativas da deformação por choque no corpo parental. O grupo químico relacionado ao hexaedrito é o IIAB.
Ataxitos (D): Raro tipo de siderito que não apresenta nenhuma estrutura óbvia quando tratados com ácido nítrico. O termo ataxito vem do Grego “sem estrutura”. É formado essencialmente com a liga rica em níquel tenita. É o tipo de siderito mais raro e nenhuma das quedas observadas até hoje de sideritos é do tipo Ataxito.