
Norton County
Fragmento 0.018g
- País: Kansas, USA
- Ano queda: 1948
- Classificação: Acondrito Aubrito
- Massa total: 1100 kg
- Queda observada: Sim
Norton County
No fim da tarde de 18 de fevereiro de 1948, às 16h56, o céu sobre o Condado de Norton, no estado do Kansas, e parte do Condado de Furnas, no Nebraska, foi rasgado por uma bola de fogo incrivelmente brilhante, seguida de um estrondo ensurdecedor que sacudiu o chão como um trovão vindo de dentro da terra. O que se seguiu foi um fenômeno espetacular e raro: uma verdadeira chuva de pedras caiu sobre uma vasta área rural do meio-oeste americano, espalhando fragmentos cósmicos por quilômetros.
Dessa impressionante queda nasceu o meteorito Norton County, um dos mais importantes e enigmáticos já registrados. Classificado como um aubrito, trata-se de um tipo muito raro de acondrito pobre em cálcio, formado quase exclusivamente por enstatita, um mineral rico em magnésio e pobre em ferro. Os aubritos são considerados extremamente antigos e se acredita que se originam de corpos celestes que se formaram muito próximos ao Sol, em regiões internas do Sistema Solar, talvez até da família do asteroide E-type. São rochas claras, leves, e frequentemente exibem uma aparência esbranquiçada a acinzentada, contrastando com a maioria dos meteoritos escuros comumente encontrados.
Mas o que torna o Norton County ainda mais especial é sua dimensão colossal: ele é o maior aubrito já recuperado no planeta Terra. A massa principal, que pesa impressionantes 1.070 kg, é hoje o destaque do acervo de meteoritos da Universidade do Novo México, em Albuquerque, onde atrai pesquisadores e visitantes de todo o mundo. Além do seu tamanho, trata-se de uma brecha de fragmentos, ou seja, uma rocha composta por pedaços de material fundido e fragmentado, remontando a violentos eventos de impacto em seu corpo original no espaço.
Curiosamente, apesar da espetacularidade da queda, o Norton County é praticamente inacessível ao mercado de colecionadores, já que quase todo o material está preservado em instituições científicas, com destaque absoluto para a coleção da universidade. Pouquíssimos gramas foram disponibilizados ao público desde sua descoberta, o que o torna um dos meteoritos mais difíceis de se obter no mundo — não por falta de material, mas por seu valor científico incomparável.
O Norton County não é apenas uma rocha caída do céu. É um mensageiro do interior mais seco e quente do Sistema Solar primitivo, uma cápsula do tempo que atravessou o vácuo por bilhões de anos até encontrar seu destino em uma tranquila tarde americana. Hoje, esse gigante branco da meteoritologia permanece como ícone da raridade, símbolo da ciência e legado de um dos eventos mais dramáticos já testemunhados no céu dos Estados Unidos.

Acondrito
Os acondritos são meteoritos rochosos que se distinguem por não apresentarem côndrulos, aquelas pequenas esferas milimétricas de silicato características dos condritos. A ausência de côndrulos indica que essas rochas passaram por processos geológicos mais complexos, como fusão parcial, diferenciação e cristalização de magma, o que as aproxima muito das rochas ígneas encontradas na Terra. Diferente dos sideritos, que representam o material denso e metálico do núcleo de corpos planetários, os acondritos são originários das regiões externas — como o manto e a crosta — de planetesimais e asteroides que, nos primórdios do Sistema Solar, foram suficientemente grandes para passar por processos de diferenciação. Quando esses corpos se formaram a partir da nebulosa solar, o calor gerado por impactos e decaimento de elementos radioativos derreteu seus interiores, permitindo a separação dos elementos mais pesados e leves. Os materiais metálicos migraram para o centro, enquanto os silicatos deram origem a lavas e rochas ígneas nas camadas mais externas. Os acondritos são, portanto, fragmentos dessas crostas e mantos, e fornecem uma visão única da atividade geológica em corpos extraterrestres primitivos.
Dentro da grande categoria dos acondritos, existem vários subgrupos distintos, cada um associado a diferentes corpos parentais e processos geológicos. Os acondritos primitivos, como as acapulcoitas e lodranitas, são uma transição entre condritos e rochas totalmente diferenciadas. Eles preservam características químicas do material original da nebulosa, mas passaram por aquecimento suficiente para fundir parcialmente e eliminar os côndrulos. Já as brachinitas são acondritos extremamente ricos em olivina e representam um tipo de manto primitivo. As ureilitas são outro tipo peculiar, com alto teor de carbono, grafite e até diamantes microscópicos, provavelmente formados por impacto. Entre os acondritos diferenciados mais estudados estão os do grupo HED: howarditas, eucritas e diogenitas. Eles têm origem no asteroide 4 Vesta e representam diferentes profundidades da crosta e do manto desse corpo. As eucritas são basaltos de superfície, as diogenitas vêm de camadas mais profundas e as howarditas são brechas formadas por colisões que misturaram os dois tipos. Outras classes importantes são os angritos, que têm uma mineralogia única e provavelmente se formaram em planetesimais distintos, e os aubritos, ricos em enstatita e com aparência muito clara, derivados de asteroides extremamente reduzidos.
Também fazem parte dos acondritos os meteoritos lunares e marcianos. Os meteoritos lunares são fragmentos arrancados da crosta da Lua por grandes impactos e que viajaram pelo espaço até atingir a Terra. São compostos por basalto, anortosito e outros tipos de rochas semelhantes às amostras trazidas pelas missões Apollo, e ajudam a ampliar nosso conhecimento sobre regiões não visitadas da Lua. Os meteoritos marcianos, por sua vez, são extremamente raros e valiosos. Eles compartilham com as análises feitas por sondas em Marte a mesma composição isotópica de gases aprisionados, especialmente o argônio, e nos fornecem informações preciosas sobre o vulcanismo, a presença de água e as condições atmosféricas do planeta vermelho em diferentes épocas. Essas amostras nos contam que Marte foi geologicamente ativo por bilhões de anos. Entre os marcianos há três grupos principais: as shergottitas, basaltos ricos em piroxeno; as nakhlitas, formadas por clinopiroxeno e com evidência de interação com água; e as chassignitas, compostas predominantemente por olivina.
Os acondritos, apesar de não representarem a maior parte dos meteoritos encontrados, são verdadeiros arquivos geológicos que documentam a história dos processos ígneos no Sistema Solar. Por sua semelhança com as rochas terrestres, eles também funcionam como pontes para compreendermos como nosso próprio planeta evoluiu desde seus primeiros estágios. Cada acondrito é uma peça-chave em um quebra-cabeça cósmico que revela como pequenos corpos primordiais deram origem a mundos inteiros — e como esses mundos foram moldados por calor, tempo e colisões. Para cientistas e colecionadores, são relíquias de um passado distante e silencioso, guardando em seus minerais as pistas da origem e evolução dos planetas.